top of page
1.png

Livro apagado: vestígios da água ilógica, 2016/2018

Fotocópia e apagamento com corretivo líquido

21 x 14,8 cm

Depois de desescrever o meu primeiro livro, eu tinha duas edições de “Carne falsa”. Se o procedimento da desescrita operava diretamente na subversão dos modos de escrever – pois se deu da direita para a esquerda e de baixo para cima –, ao olhar para o verso translúcido do papel vegetal e me deparar com a possibilidade de leitura outra vez da esquerda para direita e de cima para baixo, continuei o processo. Dava para ler o verso normalmente, embora fosse uma leitura acidentada, com frases cortadas, sobras de hífen, nonsense. Foi aí que me dei conta de que caí no perigo da continuidade, mas, como Clarice Lispector, também eu quis o inconcluso. Então comecei a pensar o meu livro como objeto inacabável.

Fiz fotocópia do verso de cada página desescrita e comecei a tratar cada uma como independente do todo. Fui lendo e apagando com liquid paper, atribuindo sentidos àquela leitura. Procurava o texto dentro do texto, que surgia por puro acaso. 

Da fresta branca que ficou na página depois da secagem do liquid paper, o olho penetrava o inacabável – o possível. O sem fim de desvios entrecortados numa profusão de fragmentos. Esses disparadores de começos.

2.png

“Livro apagado: vestígios da água ilógica” é uma terceira edição de “Carne falsa”, que apaga restos de palavras às margens e pelas páginas da parte legível do livro desescrito, espalhando uma água ilógica que deixa vestígios do que foi escondido. A página opaca da cópia não deixa transpassar a escrita, como o translúcido do vegetal. É a água do liquid paper que, ao editar as frases desconexas da leitura de cima para baixo, instaura sobre a escrita a fresta branca – que vejo como página que seca sobre as palavras quebradas pelos hifens. O gesto de apagamento com liquid paper edita as frases acidentadas que ficaram legíveis no verso da desescrita. Mas mantém o paradoxo, pois, ao pintar de branco a marca de minha leitura nas frases que restaram, o gesto permite criar não novos sentidos, mas um sem fim de desvios.

A leitura é também o misterioso.

Livro apagado: vestígios da água ilógica, 2016/2018
Instalação com 110 páginas

corretivo líquido sobre fotocópia 

21 x 14,8 cm
 

fotos-patri (340).JPG
bottom of page